quarta-feira, 4 de maio de 2011

Causos da TV ao vivo – O primeiro acidente de trânsito “no ar”


TV Piratini, fim dos anos sessenta. Para vender ao mesmo tempo caminhão FNM e o automóvel JK, Sérgio Reis bolou comercial que iniciava com a tomada do caminhão vindo do fundo do estúdio. Ao parar, descia Ayrton Fagundes, o motorista, vestindo enorme casacão de couro. Imitando gringo, dizia:

- Isto sim que é caminhón, freio de súpio e buzina de corentela. Sobe a sera com facilidade e carega mais de dez toneladas!  

Enquanto falava, ia caminhando e tirava o casacão, mostrando por baixo finíssimo smoking. Refinava então a linguagem e entrava em outro cenário com jardim, laguinho, folhagens, fachada de mansão, o JK estacionado à frente e bela mulher com vestido de noite esperando o amado.

Antes de sentar no carro, a moça dizia qual a revenda onde podiam ser encontrados os veículos.

O cliente gostou e mandou repetir.

Ayrton, na segunda apresentação, decidiu dar um pouco de “molho”: arrancaria o FNM de forma mais violenta e brecaria forte para ouvir-se o freio a vácuo.

Na hora, porém, o pé dele escorregou e o pesado caminhão avançou, demolindo o cenário e o JK.

A jovem escapou do atropelamento porque, pressentindo o perigo, levantou o longuinho e correu.

Era o primeiro acidente de trânsito ao vivo da televisão brasileira.
   
(Texto original extraído do livro “Anedotário da Rua da Praia”, De Renato Maciel de Sá Júnior, Ed. Globo, Porto Alegre, 1983)


terça-feira, 3 de maio de 2011

QUEM SABE, SABE – O SHOW DE WILLIAM WAAK E A VISÃO DE CLÓVIS ROSSI


O anúncio da morte de Bin Laden tomou conta do noticiário, especialmente na Rede Globo. 
A rede, na época dos atentados de 11 de setembro de 2001, fez uma extensa cobertura nos EUA e no mundo, apoiada na sua enorme e competente estrutura de correspondentes internacionais.

No dia seguinte ao pronunciamento de Barak Obama (feito quase à meia-noite de domingo), todos os telejornais da Globo (assim como as demais redes) exploraram o tema exaustivamente. Mas coube ao Jornal Nacional – logo ele, a jóia da coroa – o único deslize global: o excesso de autopromoção na qualidade da cobertura. Por mais completa que tenha sido, a edição do JN de segunda-feira forçou a barra ao exaltar a extensão da cobertura e a agilidade da emissora ao dar em boletim de plantão o anúncio de Obama.
Mesmo assim, este efeito da concorrência de hoje entre as redes não comprometeu a esperada competência na abordagem do tema.

Quem roubou mesmo a cena foi o experiente William Waak, âncora do Jornal da Globo, ao lado de Cristiane Pelajo. Veterano de coberturas de guerra, especialmente no Oriente Médio, autor de livros sobre o assunto,  William saiu da bancada para dar, junto aos telões do cenário, uma aula sobre a geopolítica e a realidade daquela região. Esmiuçou a intrincada teia das várias correntes terroristas e suas inspirações, afinidades e contradições. Com um texto fluido, objetivo, dispensou o tele-prompter e se valeu da vivência e do conhecimento de campo de quem sabe muito bem o que se passa naquela parte do mundo há  tempos. A performance de William Waak foi mais esclarecedora do que as dezenas de entrevistas com os especialistas em Oriente Médio recrutados pelas TVs desde o último domingo.
Quem sabe, sabe.

Na imprensa escrita, Clóvis Rossi, da Folha de SP, acertou em cheio no seu artigo sobre a ameaça da continuidade do terrorismo, mesmo com a morte de Bin Laden. Lembrou que sufocar Al Qaeda e congêneres não resolve, porque fundamentalismo não tem cura. 

Rossi apontou que o melhor horizonte para a região surge com as revoltas populares que estão arejando a vida medieval dos países de lá. Mudanças que, embora à custa de sangue, estão abrindo, aos poucos, caminho para reformas políticas e sociais que poderão levar a uma melhor qualidade de vida para as populações. 

Os movimentos no Egito, Tunísia, Síria, e Líbia estão mostrando que os tiranos, seus clãs e dinastias, já não são inatingíveis. Quando houver por lá sociedades mais justas, os fundamentalistas histéricos e suicidas perderão espaço para perpetrar e divulgar seus delírios. Basta os povos islâmicos terem direito a uma vida mais digna, sem a imposição brutal de costumes da idade das trevas a reger suas vidas.