segunda-feira, 2 de abril de 2012

CAMINHANDO, CANTANDO E REPETINDO A CANÇÃO...

Já se vão 48 anos desde o primeiro dia daquele período que se convencionou chamar de “Anos de chumbo” .

Foram 20 anos de domínio dos militares no comando do país.

O Golpe de 64 instaurou no país uma ditadura de farda que, como toda ditadura, trouxe imposições severas à nação, a começar pelas restrições à liberdade de imprensa e de manifestações públicas contra o “regime”.

Ao longo deste tempo, o garrote proporcionou fases de sufoco torturante e outros mais, digamos, complacentes, conforme os humores do general-presidente e seu Estado-Maior, acomodados em Brasilia naquele momento.

Ninguém discute que houve excessos em nome de uma pretensa proteção da pátria.

Gente foi torturada e morta nos calabouços dos quartéis e delegacias.
A censura contra a imprensa, a arte e várias formas de expressão foi inclemente.
Os algozes mais ainda.

Por outro lado, grupos de ativistas pela volta da democracia fustigaram os militares, na tentativa de provocar fissuras que permitissem derrubar o muro do regime autoritário.

As escaramuças, antes legítimas pela intenção, passaram a flertar e agir muitas vezes como puro ato de terrorismo.

Com a frieza e a inconseqüência que está na natureza deste tipo de ação.

No clima da Guerra Fria, utopias turvaram pensamentos e orientaram ações afoitas e mortais na caserna e entre os grupos guerrilheiros. 

Os dois lados abusaram da violência.

Gente inocente foi morta por ambos, em maior ou menor proporção - o que não exime ninguém de culpa.

Em 1985, depois de um período classificado como “distensão” ou “abertura lenta e gradual”, aconteceram as eleições, ainda indiretas, mas que, bem ou mal, permitiram a volta dos civis ao comando da nação.

Era como se o país estivesse nascendo de novo.

Hoje, por estes dias em que o “golpe” faz aniversário (31 de março ou 1º. de abril - a data varia conforme os historiadores), o assunto, que está sempre pairando sobre nossas cabeças, mesmo quase três décadas depois, ganha novo fôlego.

Mas, como em toda nação imatura, o que turbina os debates é, invariavelmente, o clima de revanche.
E voltamos a remoer o passado, enaltecendo mártires e execrando carrascos.

Discussões acaloradas focam na punição dos militares que excederam os limites do dever. Ou o distorceram, e em nome disso cometeram crimes.
E no meio disso tudo, uma certa aura de romantismo libertário atenua ou mesmo perdoa os excessos cometidos pelos militantes “de esquerda”, que também seqüestraram, torturaram e mataram, escudando-se na luta pela democracia.

É uma discussão interminável.

Até que ponto devemos dedicar tanta paixão a este debate, quase meio século depois do início da quartelada de 64?

Porque temos tanta necessidade de chafurdar revolver este tema, como se precisássemos ter uma história épica de revolução para nos orgulhar diante do mundo, agora e daqui a 100 anos?

Precisamos tanto assim de uma Bastilha para nos vangloriar da capacidade de levante popular?

Se há quase 30 anos os militares deixavam o poder, hoje o que temos é uma classe política que ainda não honrou a vitória que a nação obteve quando a tropa deixou o Planalto para voltar aos quartéis.

Desde então, temos visto descalabros no Congresso e na administração pública em geral, que nos maculam perante o mundo muito mais do que o período militar.
Exemplos deploráveis que contaminam as novas gerações.

Desmandos, conluios, hipocrisias criminosas, assaltos à nação que, mais do que bilhões surrupiados em dinheiro, continuam a consolidar uma cultura de leniência com o “toma lá, dá cá”, de resignação com uma estrutura viciada que não se conserta nunca e só piora, com a máquina pública que só consome impostos e vira as costas para a nação. 

Nossa imagem negativa mundo afora, mesmo com todos os ufanismos turbinados pela Era Lula (coisa que a esquerda sempre criticava no regime militar, como a grandiloqüência delirante do “Milagre Brasileiro”), não muda com expressões do tipo “Nunca na história deste país...”

Está na hora de dar menos paixão às discussões embaladas por canções de Geraldo Vandré e tratar de agir com mais firmeza para mudar o aqui e agora - essa sim, a atitude que vai fazer alguma diferença no nosso presente e no nosso futuro.

Está na hora de discutir pra valer a reforma política, que nunca vai acontecer se deixarmos este trabalho para a classe política.

O mesmo vale para a reforma tributária.

Isso sim fará diferença nas nossas vidas, e não um tribunal de inquisição permanente para exorcizar o passado.

Muitos dirão que isso é escapismo, cumplicidade, tolerância com ditadores, etc.

A patrulha não descansa, como se não tivesse mais o que fazer pelo país.

No dia em que toda esta energia for canalizada para tratar do presente, aí sim talvez tenhamos alguma chance de mostrar ao mundo e aos nossos filhos e netos, que fomos suficientemente maduros para construir centenas de eficientes hospitais públicos, escolas e universidades bem estruturadas.

E que só depois disso nos preocuparemos em sediar copas do mundo e olimpíadas.








Um comentário:

  1. Toda discussão é válida, Ricardo! Enquanto o passado não for bem compreendido e saturado por análises e exposições, o presente e quiçá o futuro, continuará em aberto. É no resgate da história que se pode compreender como as situações políticas e sociais foram arrastando-se até os dias de hoje, em uma "liberdade ditatorial". De uma forma ou de outra, eles continuam no (des)comando. Rememorar o passado é, em alguns casos, mostrar ao povo de hoje que lavantes em prol de interesses sociais são possíveis. Mesmo que os comportamentos humanos tenham alterado-se, ou seja, que as pessoas estejam "mais acomodadas", sempre restam exemplos a serem mostrados para tentar mudar o quadro infame do descaso da política no país tropical. O povo acha lindo receber a Copa e reclamar, sentado nas suas poltronas, do descaso dos comandantes com a saúde,segurança, educação... É necessário conscientizar que, mesmo que a mudança seja a conta gotas, ela precisa começar. Na maioria dos casos, cabe a nós, jornalistas, fazer o movimento inicial. Mas, essa é apenas uma opinião pessoal.

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