LUIS FELIPE SILVEIRA é um dos melhores exemplos da nova geração de cinegrafistas gaúchos. O profissional talentoso que começou como motorista da reportagem da RBSTV, passou a técnico de áudio e logo se tornou repórter cinematográfico. Depois de passar pela RBSTV, pelo SBT e Globo de São Paulo e Rio de Janeiro, vem trabalhando há 4 anos em Curitiba na RPCTV (maior rede do Paraná, aflliada da Globo). Já tem no currículo algums prêmios como Sangue Bom de Jornalismo e o cobiçado Prêmio Embratel, com a reportagem "Infância Perdida", veiculada no Fantástico, que mostrou a situação das crianças que trabalham em lavouras de fumo. Felipe tem um olhar bastante preciso sobre sua função e o jornalismo.
1) A imagem mais difícil que já gravou:
Todos os dias nos deparamos com matérias difíceis, histórias comoventes. Mas há menos de um ano, fiz uma matéria que contou a história de menino que tinha 22 anos, portador de uma doença degenerativa. Não caminha, depende da ajuda do pai para se locomover, comer, viver. Seu pai abandonou o emprego que tinha em uma metalúrgica para ficar o tempo inteiro com seu filho. Colocou uma oficina mecânica no pátio da casa em que mora, onde realiza consertos de automóveis. Estava com despejo decretado, contas atrasadas. Quando vários médicos o atenderam e não sabiam diagnosticar seu filho, foi pesquisar a doença. Dias e dias em uma biblioteca da cidade, achou o que era. Ver aquele pai, com suas vestes simples, largar aqueles motores da oficina para fazer café para o seu filho, amassar uma banana, organizar os cerca de 18 remédios que ele toma, foi realmente muito difícil. Sem a companhia da mãe, em momento algum demonstrava cansaço em cuidar do rapaz. E aquela demostração de amor que ultrapassava os muros daquela oficina fez os olhos da equipe ficarem com um brilho maior do que o normal. Foi bem difícil.
2) O pior momento para um cinegrafista:
A situação das “duas portas”, sem dúvida. A imagem daquele preso, daquele político que pode sair pela porta da frente ou pela a dos fundos. Sempre é uma decisão que tem que ser tomada rapidamente, baseada na movimentação, na observação. Uma fonte no local também pode ajudar a arriscar tudo ou ficar junto com outros jornalistas.
3) A imagem mais gratificante:
A que pode ajudar alguém de alguma forma, sensibilizando o telespectador e o fazendo colaborar. Durante a cobertura das enchentes em Antonina-PR depois do carnaval, testemunhamos várias histórias tristes. E cada vez que a matéria ia para o ar, o telefone tocava dizendo que pessoas se sensibilizaram, que queriam ajudar. Isso é gratificante.
4) Maior perigo que já enfrentou trabalhando:
Em 2006 estava no Rio de Janeiro em uma cobertura de conflito entre duas comunidades da Zona Sul carioca. Rocinha e Vidigal se enfrentavam pela disputa de poder do tráfico de drogas. Por volta das 11hs da manhã começou um intenso tiroteio. A entrada do pelotão de elite da polícia fez intensificar o clima de tensão. Ali eu percebia a importância de tentar antecipar as ações. Se proteger e ao mesmo tempo não perder a visão da situação. Qualquer movimento errado, atravessar uma rua, poderia ser fatal
5) Maior defeito de um cinegrafista?
Achar que sabe tudo, que já viu tudo. Isso vicia o olhar e não te permite ousar, fazer imagens novas.
6) E de um repórter?
Querer aparecer mais que a notícia. E, por incrível que seja, ainda existem profissionais assim.
7) Câmeras modernas salvam cinegrafistas limitados?
Ajudam, mas não salvam. A tecnologia nunca vai substituir a sensibilidade.
8) Cinegrafista deve interferir na edição?
Acompanhar a edição sim, sempre que possível. Sugestões, abre áudios, coisas que foram feitas durante a captação podem passar desapercebidas na hora de editar o VT. E mais uma pessoa para ajudar quando o relógio parece andar mais rápido, pode ser bem útil.
9) Como a tecnologia está influenciando no papel do cinegrafista?
Hoje temos câmeras muito mais modernas, que gravam em Alta Definição. Temos que aproveitar esta tecnologia para aprimorar o nosso trabalho. Podemos entrar ao vivo de pontos que não imaginávamos. Hoje podemos levar a informação de praticamente todos os pontos.
10) O que é mais importante no olhar do cinegrafista?
Aliar a técnica com a sensibilidade. Direcionar o olhar para a verdade.
11) Cinegrafista mulher tem espaço?
Sem dúvida. A sensibilidade de uma mulher, a visão diferenciada que tem só vem acrescentar. Pena que ainda temos poucas no mercado.
Não vejo esta diferença. Tem repórteres mulheres que se arriscam mais que homens para ir atrás de uma história. Acho que é mais relacionado com o perfil do que com o sexo.
13) Que peso o cinegrafista deve ter na construção da matéria?
Ele é responsável por toda a parte de imagens da matéria e para isso, tem que estar ciente da pauta, participar das reuniões, sugerir texto, acompanhar a edição. O cinegrafista que só se preocupa com a imagem está perdendo o lugar no mercado.
Ler, assistir a filmes, estar bem informados. Hoje, isso faz muita diferença quando se tem 1 hora para fechar uma reportagem.
15) Dica para repórteres novatos:
Não deixar que a vontade de fazer uma reportagem atropele o sentimento das pessoas.
16) Qual o tipo de reportagem mais desafiante?
Gosto bastante de jornalismo investigativo. A apuração, a estrutura, as apostas. Uma investigação é sempre desafiante.
17) Como percebe o olhar dos editores e chefes de reportagem sobre o trabalho dos cinegrafistas?
Bons editores e chefes sabem muito bem da importância de um bom repórter cinematográfico. O nosso trabalho é apenas uma parte do processo de reportagem. E se ele estiver bem feito, a diferença vai ser notada não só por editores e chefes – para o telespectador também, que é o nosso principal foco.
18) Cinegrafistas que fizeram história:
Edson Silva, que está na Globo Nordeste, Eduardo Mendes , Fernando Ferro e Marcelo Benincassa (TV GLOBO SP), José Henrique (TV GLOBO RJ), Alexander De Marco, Carlos Costa e Rafael Trindade (RPCTV) Jean Ribeiro (REDE RECORD) e Milton Cougo, hoje free no RS, são profissionais que admiro muito o trabalho. Sempre que assisto uma reportagem deles sei que vou aprender algo diferente.
19) O telejornalismo mudou?
Mudou e acelerou. Mesmo com a tecnologia que temos de transmissão de dados, de comunicação, o tempo está cada vez menor e a exigência do telespectador, maior. Hoje o telespectador é mais interativo, participa mais. E como a gente, não tem mais tempo para o que não importa.
20) As TVs usam cada vez mais imagens de populares com celular ou câmeras fotográficas. Isso preocupa?
Não. As imagens feitas pelos telespectadores vêm reforçar esta tendência da interatividade, de participação. Mas não vão substituir a sensibilidade do repórter cinematográfico.
- Comentário transmitido pelo grande Milrton Cougo:
ResponderExcluir- Em primeiro lugar agradecer ao Ricardo Azeredo por este espaço dedicado aos profissionais da imagem. Aos colegas da antiga nem é preciso elogiar, mas é uma satisfação ver o Felipe Silveira, grande caráter e profissional desta nova geração contando parte da sua história.
Só posso desejar todo sucesso!!!
Um forte abraço!
Milton Cougo