quinta-feira, 17 de novembro de 2011

QUIZ DOS REPÓRTERES CINEMATOGRÁFICOS - GILBERTO TRINDADE

GILBERTO TRINDADE começou em 1979, quando a RBSTV ainda se chamava TV Gaúcha. Era contra-regra (ajudava a montar cenários, onde aprendeu conceitos de iluminação, áudio e balanço de câmera (regulagem para a captação de imagem). Foi ali que ele começou a “escola” de repórter cinematográfico.
No depto. de Telejornalismo, foi auxiliar de cinegrafista (era o que se chamava na época de “pau de luz”, o operador da iluminação da equipe de reportagem. Em 84 passou a ser Operador de VT (naqueles tempos a câmera não tinha gravador; este era uma peça separada, um enorme “videocassete” que pesava até 18 kg. Quem levava o “Urso” pendurado no ombro era o operador de VT, ligado ao cinegrafista por um cabo). Na metade dos anos 90, Trindade foi promovido a repórter cinematográfico. Além do jornalismo diário, fez programas especiais nos EUA e na Europa. Ficou na RBSTV até 2011 (sendo 15 anos na TVCom). Hoje integra a equipe do programa Brasil Urgente, da Band RS.


1) A imagem mais difícil que já gravou?

Foi uma rebelião de menores na FASE, a antiga FEBEM. Entrei junto com a Dulce Helfer,  fotografa da Zero Hora. Os menores queriam uma equipe de TV para fazer suas reinvidicações. Já haviam matado um monitor. Foi há cerca de 10 anos..
2) O pior momento para um cinegrafista?

O pior momento é quando vamos cobrir uma operação policial. Temos que ficar atentos a tudo, não podemos nos descuidar das imagens e, ao mesmo tempo, não podemos nos descuidar do que esta acontecendo em nossa volta, nossa segurança.



3) A imagem mais gratificante

Foi quando gravei o salvamento de um cavalo que caiu no Arroio Ipiranga, em Porto Alegre mostrando o trabalho dos bombeiros e a torcida que assistia.
4) O maior perigo que já enfrentou trabalhando

Quando entrei na FASE no dia da rebelião que já mencionei. Os menores estavam armados com uma pistola, facas e estiletes. Entrei somente com a câmera e sem proteção policial. Já haviam matado um monitor e estávamos apenas eu e a fotógrafa de ZH.


5) O maior defeito de um cinegrafista?

Não saber trabalhar em equipe. Não prestar atenção no que o repórter está conversando com o entrevistado, para saber que imagens buscar para a matéria.



6) E de um repórter?

Não saber se posicionar diante da câmera quando está fazendo uma entrevista em pé, muitas vezes invadindo o eixo do enquadramento.
7) Câmeras modernas salvam cinegrafistas limitados?

O cinegrafista tem que conhecer o equipamento com que trabalha. Se não souber utilizar os recursos da câmara, mesmo sendo a mais sofisticada do mundo, de nada adiantará.



8) O cinegrafista deve interferir na edição?

Deve auxiliar quando solicitado pelo editor.
9) Como a tecnologia está influenciando no papel do cinegrafista?

A tecnologia está facilitando nosso trabalho. As câmeras digitais são mais leves, e as tradicionais fitas foram substituídas por cartões de memória..



10) O que é mais importante no olhar do cinegrafista?

O mais importante é não perder o foco da matéria,  e ao mesmo tempo enxergar tudo o que está acontecendo à sua volta.
11) Cinegrafista mulher tem espaço?

Acredito que sim. Conheci duas ótimas cinegrafistas. Esta é uma profissão que serve tanto para homens como para mulheres.



12) Há diferença em trabalhar com repórter homem ou mulher?

Não vejo nenhuma diferença.
13) Que peso o cinegrafista deve ter na construção da reportagem?

O trabalho do repórter e do cinegrafista tem que ser em equipe, para poder render uma boa matéria. Isto é, imagens e informações coerentes. Acredito que 50% de cada reportagem vem das imagens e 50% das informações que o repórter colhe..



14) Dica para cinegrafistas novatos:

Antes de sair da TV se informar com o reporter que materia vai fazer e o que vai precisar de material para poder fazer um bom trabalho.
15) E para repórteres novatos:

Tirar suas dúvidas com os repórteres mais experientes e ouvir seu cinegrafista na hora de construir da matéria.



16) Qual o tipo de reportagem mais desafiadora?

É aquela que, a principio, não tem lógica nenhuma e que, de repente, se consegue um bom “gancho”, transformando uma “materinha” em uma grande reportagem com boas imagens e bom texto.
17) Como percebe o olhar dos editores e chefes de reportagem sobre o trabalho dos cinegrafistas?

Nossa função é trazer boas imagens para a edição das matérias. Imagens boas fazem parte do trabalho; quando se tem imagens ruins, é sinal de cobrança.



18) Cinegrafistas que fizeram história:

Mario Vial, Luiz Quilião, Gilberto Rosa, Juarez Dornelles e Flavio Gomes;
19) O telejornalismo mudou?

Sim, o telejornalismo vem mudando todos os dias. Ele se adapta às novas tecnologias e à correria do nosso dia a dia.



20) As emissoras de tv usam cada vez mais imagens de populares feitas com celulares e cãmeras amadoras. Isso preocupa?


Não. São imagens do momento, cenas impossiveis de pegarmos, de estarmos no local na hora que esta acontecendo. Ao mesmo tempo não se discute qualidade.?

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

PROFISSÃO PERIGO - Por Milton Cougo

Milton Cougo é um dos mais respeitados repórteres cinematográficos do país.  Trabalhou na RBS TV, Rede Globo, TVE, SBT e Band de Porto Alegre e São Paulo, além de produtoras do centro do País. Foi o primeiro repórter cinematográfico a presidir a Associação dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio Grande do Sul – ARFOC-RS. Hoje é vice-presidente da entidade. É um dos mais premiados no sul (foi o primeiro Prêmio Esso para uma equipe de TV gaúcha, do SBT). Participou de várias coberturas internacionais e campanhas políticas no Rio Grande do Sul, Roraima, São Paulo e no Paraguai. Atualmente trabalha na Unidade de Comunicação do Sistema FIERGS. É também vice-presidente da ARFOC-RS.   



PROFISSÃO PERIGO

É com pesar que perdemos o colega Gelson Domingos da Silva, da TV Bandeirantes, alvejado por um tiro na cobertura da Favela Antares, no Rio de Janeiro. Mais um profissional da imagem! Mais uma vida!

Uma noticia velha! Vivemos numa correria onde o tempo voa, a informação é instantânea!

Depois da morte do Gelson, quanta coisa já aconteceu: tomada da Rocinha, muita gente nasceu, muita gente morreu!

Eu não conhecia o Gelson, mas resolvi escrever algo.

Sou repórter cinematográfico e trabalho há 32 anos. Posso dizer que tenho alguma experiência e passei por muitas situações de risco. Sei que muitos colegas também já passaram e passam no seu dia a dia por estas coberturas.

Somos jornalistas da imagem, apaixonados pela nossa profissão, por cumprir nosso ofício de bem informar através das imagens.

Talvez só por isso acabamos sendo vítimas do nosso despreparo. Não somos policiais treinados. Nossa arma e escudo é uma câmera de video ou fotográfica.

Acho que está na hora das empresas de comunicação, faculdades, autoridades e profissionais tomarem uma atitude. Proporcionar um curso preparatório, receber orientações necessárias, melhores condições de trabalho e precauções.

Já está provado que não adianta só dar um colete a prova de bala. O tiro não respeitou o colete do Gelson.

Temos ótimos profissionais, alguns experientes e outros nem tanto, que contam com o anjo da guarda de plantão. Em relação ao colete, por exemplo, não pode ser da mesma cor do colete da polícia. Deveria ser padronizado com a identificação de imprensa.

Só que isto é muito pouco. Não somos super-homens. Não acontece nada, até o dia de folga do anjo da guarda.

Você está na redação e chega a informação de um tiroteio; aí a chefia convoca a primeira equipe livre ou a mais próxima para fazer a reportagem. Só que a repórter saiu da faculdade há pouco tempo, e o repórter cinematográfico é novo... Nunca passaram por nada igual, nunca foram treinados para este momento.

Mas arriscarão suas vidas e poderão não voltar.

Há profissionais que são contratados como operadores de câmera de externa para exercer a função de repórter cinematográfico, ganhando menos e nem sempre com a qualificação necessária.

Acho que não pode ser assim.

Os profissionais deveriam ser preparados para fazer parte de uma editoria especial, levando em consideração a qualificação e o perfil de cada um.

Quem comanda nas redações também deve ter o conhecimento para avaliar.

Com isto não estou generalizando; sei que também há profissionais preparados para este tipo de cobertura. Mas é uma minoria dentro do universo que vivemos.

Não escrevo para achar culpados. Acho que todos nós somos responsáveis. Vivemos tempos de muita violência, devemos nos unir para discutir e colocar em prática melhores condições de trabalho e soluções para preservar a vida.

Que a morte do Gelson não tenha sido em vão! Mais uma vida!

ATENÇÃO COLEGAS E ESTUDANTES: O DIPLOMA NÃO É TUDO!

Nesses dias em que retomamos novamente a discussão sobre a exigência do diploma para a função de jornalista, volto a chamar a atenção para outro aspecto que transcende ao debate sobre o “mandato” conferido legitimamente pelo canudo.

A gurizada que está numa faculdade de comunicação e que, com toda razão, fica alarmada com a possibilidade de perder o motivo pelo qual estudarão (e pagarão) por 4 anos ou mais, tem que considerar que a formação técnica da universidade, infelizmente, não é tudo.

Muito menos garantia de emprego.

Insisto num ponto que para mim é especialmente crítico: a formação individual. Algo mais profundo que a assimilação pura e simples de conceitos sobre a semiótica na comunicação, teorias sobre o papel social da imprensa e outros conceitos tipicamente acadêmicos.

Defendo a exigência do diploma, mas é preciso aceitar que ele não é salvo-conduto para uma carreira estável ou bem sucedida.

Pela minha experiência como jornalista formado há 27 anos, e de professor universitário, penso que, o que realmente vai fazer a diferença na hora de batalhar por um emprego - ou se consolidar nele – é, acima de tudo, a formação pessoal.

Sempre bati nesta tecla com os meus alunos nas aulas de rádio e telejornalismo: tão importante quanto a formação acadêmica é ser um jornalista formado como cidadão plenamente capaz da responsabilidade que esta missão traz.

Isto significa ter consciência do nosso papel, tendo noção clara do estrago que somos capazes de fazer quando agimos irresponsavelmente.

Significa também investir na base cultural, ser uma pessoa bem informada não só sobre as manchetes do dia, mas sobre as mais diversas áreas do conhecimento.

Fico assustado com a alienação que assola nossos futuros jornalistas - para não falar de muitos que já estão na linha de frente.

E fico ainda mais apreensivo quando vejo que grande parte dos alunos em final de curso já está trabalhando, estagiando em assessorias de comunicação ou redações – quando não estão empregados mesmo.

Ótimo que já tenham uma colocação. Mas temo pelo desempenho desta gente, e a contribuição que podem dar à nossa sublime missão de bem informar.

Até 2010, eu aplicava sempre, na primeira parte das minhas aulas, o que chamava de “teste de conhecimentos gerais e atualidades”, valendo nota.

Perguntava sobre tudo: os fatos mais importantes do momento e seus desdobramentos, quem escreveu tal livro, quem governa tal país, onde fica determinada nação, o que deflagrou tal guerra, o que significa uma teoria científica x, um conceito de economia y, e por aí vai.

O resultado geralmente era desastroso. Um lamentável show de respostas inconsistentes e muitas vezes absurdas. Algo realmente desanimador.

Tristemente concluo que a maior parte da gurizada nova que hoje ingressa na profissão está mais ligada nos fuxicos e exibicionismos perpetrados no MSN, Facebook ou Orkut, do que nas capas dos jornais ou sites de notícias. A grande maioria não sabe o que saiu nos telejornais, mas tem na ponta da língua quem vai sendo eliminado do Big Brother.

Nos fones de ouvido, só música (geralmente ruim) ou papos desmiolados em rodinhas de locutores das FMs,  especializados em transformar qualquer tema num show de “comentários” ridículos, decorados com gargalhadas quase histéricas. Um modelo hoje consagrado hoje nas FMs, com raras e honrosas exceções. 

Outro problema gravíssimo dos futuros profissionais: ter um exemplar de boa literatura sempre à mão? Nem pensar...

O que me anima é que, ao discutir com aqueles mesmos alunos os resultados das provas, eles riam. Mas ao mesmo tempo em que debochavam – um tanto constrangidos - da própria ignorância, iam aos poucos desenvolvendo um certo senso de autocrítica. E nas aulas seguintes revelavam outra atitude, valorizando hábitos como a leitura diária dos jornais, assistir telejornais, ouvir noticiários no rádio, etc.

Por isso, aos recém chegados neste ofício e aos que estão quase lá, insisto: O DIPLOMA NÃO É TUDO!

Para quem vive no mundo da lua, é pouco mais que nada, num mercado cada vez mais competitivo.

  








sábado, 12 de novembro de 2011

O ESTILO "VEM COMIGO!" E SEUS EFEITOS - Parte 2

No post anterior, falamos sobre a febre das matérias aceleradas e narrativas exageradas, que caracterizam o que se convencionou chamar de estilo “Vem comigo!”.

Uma tendência que se estabeleceu no telejornalismo brasileiro nos últimos anos e que, ao que tudo indica, terá vida longa.

Mas até que ponto as abordagens frenéticas, com repórteres desnecessariamente ofegantes e imagens nervosas, poderão se tornar o estilo predominante nos telejornais?

O último post terminou com a seguinte pergunta: é possível conduzir reportagens em programas de temática policial e dramas do cotidiano sem ser “over” no papel de narrador dos fatos?

Sem dúvida!

Uma tendência da mídia jornalística não representa um decreto sobre posturas de repórteres; e muito menos a consolidação de um estilo único, padrão, nos telejornais.

Mesmo que um programa seja voltado essencialmente para notícias policiais (Cidade Alerta, Brasil Urgente, Balanço Geral e outros), e ainda que seus âncoras incorporem um modelo mais personalista, e muitas vezes  caricatural, os repórteres podem se adequar à linguagem que os editores pedem, sem no entanto precisarem bancar histéricos perseguidores de ladrões de galinha.

É possível sim, contar uma boa história - mesmo as do chamado “mundo cão” - sem  ignorar a sensatez e o equilíbrio, preservando nossa tarefa primordial que é a de informar, e informar bem.

Se o “Vem comigo!” exige muita capacidade de improviso, com narrativas como se fossem ao vivo, isso não significa que o clima daquele momento justifica atropelar a gramática e, principalmente, a verdade.
Quando um repórter é pego de surpresa numa pauta em que vai ter que improvisar o tempo todo, o que vai fazer a diferença entre uma abordagem frenética, inconsistente, e um trabalho sério, é a base de informações que ele tem sobre o universo em que trabalha.

Se a pauta diária é dominada pelos assuntos policiais, o repórter e o repórter cinematográfico tem que conhecer bem armamentos, as rotinas e táticas policiais, as características sócio-econômicas das comunidades que habitualmente cobrem.

Essencial também entender as peculiaridades da natureza humana,  para não expor pessoas inocentes e provocar tsunamis que arrasam reputações e prejudicam, algumas vezes definitivamente, as vidas de famílias ou instituições. 

É bom não esquecer: nosso ofício, quando mal aplicado, é extremamente eficiente na arte de acabar com a vida das pessoas.

Por fim, e não menos importante: um vocabulário bem calibrado garante um improviso mais seguro e consistente.

E isso, claro, só se resolve com muita leitura.


























quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O ESTILO “VEM COMIGO” E SEUS EFEITOS – Parte 1

Desde sempre, algumas reportagens de TV exigem que o repórter atue de forma agitada, perseguindo os acontecimentos literalmente passo a passo, ritmo acelerado, às vezes até correndo com microfone na mão e gravando ao mesmo tempo.

Normalmente não são performances estudadas. Acontecem assim porque a situação exige: uma ocorrência em que a equipe acompanha policiais em perseguição, um tumulto em que se vê no meio dos acontecimentos, e é preciso escapar das bombas de gás lacrimogêneo, balas perdidas, etc.

Mas nos últimos anos, a reportagem de TV no Brasil foi contaminada por um surto de agitação que influiu diretamente na linguagem das matérias, criando um novo estilo e uma tendência cada vez mais seguida pelo mercado. Um estilo em que repórteres ofegantes, imagens instáveis e edição nervosa criaram uma confusa fronteira entre uma história bem contada e uma narrativa exagerada – quando não espalhafatosa e irreal.

É o chamado “Vem Comigo”.

Uma expressão que em muitos casos vem sendo aplicada de forma injusta.

Ela ficou celebrizada pelo trabalho de um excelente repórter: Goulart de Andrade, veterano da Tupi, Globo, Band, SBT e Record. Até hoje, aos 77 anos,  conduz reportagens especiais em que ele conta em detalhes histórias que normalmente não aparecem nos telejornais. Goulart faz uma leitura diferenciada tanto de assuntos factuais, prosaicos ou mesmo os mais bizarros. Usa pouco texto em off; apóia quase toda a narrativa em passagens, que ele sempre termina convidando o telespectador a acompanhá-lo: “Vem comigo!”.

Goulart descreve os assuntos com carisma e elegância, dosando com humor equilibrado quando necessário, e evitando sempre cair no tal sensacionalismo.  Hoje ele atua no SBT Repórter, mantendo-se fiel ao estilo que o notabilizou.  

Certamente Goulart não deve estar gostando do que está vendo hoje em algumas emissoras.

O “Vem comigo!” funciona muito bem quando o repórter tem o que dizer,  sabe improvisar sem ser repetitivo, exagerado ou mesmo alarmista.  Narrar o fato no calor dos acontecimentos exige objetividade e apreço à verdade, evitando a sedução da dramatização exacerbada e do exibicionismo.

Repórteres que supervalorizam um assunto inflando a narrativa com adjetivos fortes, criando “teorias” pessoais para o que vê (ou pior, para o que não vê), narrando quase aos gritos e impondo um ritmo forçosamente frenético, parecem mais anunciantes de tele-vendas que jornalistas.  

Mas aí vem a pergunta: é possível conduzir reportagens em programas de temática policial e dramas do cotidiano, sem ser “over” no papel de narrador dos fatos?

Claro que sim. E as provas estão aí, no ar. Confira no próximo post sobre o tema. Até lá!






segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A MORTE DE GELSON E AS LIÇÕES DA COBERTURA POLICIAL

Há muito tempo as equipes de reportagem de tv, rádio e jornal cobrem as batalhas urbanas contra o tráfico no RJ e SP.

Tempo suficiente para que os veículos assimilassem informações que garantissem mais segurança aos profissionais nas coberturas.

Isso significa conhecer bem os armamentos dos dois lados, o uso e seus efeitos (reais, não os dos filmes). E estabelecer parâmetros de atuação para suas equipes neste território sem lei.

Naturalmente, uma equipe de imprensa não atua com técnica militar. Mas não dá pra confiar sempre na sorte e apostar na ilusão de que bala não pega jornalista, e que colete é uma proteção divina, infalível.

Se é preciso cobrir uma ação policial deste porte, o profissional tem que ser “meio soldado”, para saber como se proteger, como se deslocar no terreno e não ficar no fogo cruzado.  

Jornalista que não sabe se posicionar com segurança pode levar bala de bandido e de polícia.

Isso é fundamental para se trabalhar bem nestas situações, sem arriscar a vida – ou pelo menos não arriscar tanto.

Uma imposição especialmente necessária para cinegrafistas e fotógrafos, que sempre procuram o melhor ângulo.

Nos conflitos contra o tráfico, as balas voam disparadas por bandidos que usam armamento de grande potência e cadência.

A grande maioria da bandidagem não sabe atirar com eficiência.

Mas alguns sabem sim, usar um fuzil, como ficou tragicamente provado neste domingo, com a morte do repórter cinematográfico Gelson Domingos, da TV Bandeirantes.

As imagens (feitas por ele mesmo) mostram que Gelson estava perigosamente posicionado exatamente atrás do policial que atirava contra os traficantes. Logo, era um alvo tão visado para o fogo de resposta quanto o policial.

Cobrir a guerra urbana contra o tráfico, que em RJ e SP assumiu proporções de conflito permamente e crescente, traz riscos equivalentes à cobertura de uma guerra convencional.

Ou pior, são similares aos confrontos no Iraque e Afeganistão, onde as tropas combatem homens cegos pelo fanatismo religioso, que não usam uniforme, e atiram para matar.  

Na prática, a única diferença é que nas favelas daqui não há bombardeios aéreos nem artilharia pesada de retaguarda.

E aqui, os criminosos atiram turbinados pelas drogas. Disparam tresloucados, sem critério algum, na direção das balas que vão contra eles.

Atuar neste cenário de guerra não convencional exige cada vez mais que nós, jornalistas, saibamos não só o máximo sobre fuzis, pistolas, munições, coletes, táticas de proteção, etc.
Exige que saibamos, acima tudo, das nossas limitações.

Por mais que queiramos a melhor imagem, a melhor matéria.

Não somos invulneráveis. E no meio do tiroteio, bandido chapado não quer saber se quem está lá do outro lado é polícia ou jornalista.